Como está a IoT a mudar os negócios?

A Internet das coisas (IoT) está a ser utilizada, de forma crescente, para transformar dados em conhecimento. E as empresas estão a usá-la para criar novas ofertas para os seus clientes e mudar as suas estratégias

Organizada pela Associação Portuguesa para o Desenvolvimento das Comunicações (APDC), a conferência “Como está a IoT a mudar os negócios” decorreu no Myriad Crystal Center, no Parque das Nações, em Lisboa, com a participação de responsáveis dos setores informático, energético, banca, seguros e saúde. O Digital Business Breakfast, da APDC, mostrou que as possibilidades são infinitas e que este é um processo evolutivo onde a mudança é constante.

Mas o que é isso da Internet das coisas ou Internet de tudo? A Internet Society define a IoT como "a extensão da conectividade de rede e capacidade de computação para objetos, dispositivos, sensores e outros artefactos que normalmente não são considerados computadores”.

Neste universo estão, entre outros, veículos, luzes de trânsito, eletrodomésticos, câmaras de vigilância, detetores de condições ambientais, sensores de presença e dispositivos médicos. São apenas alguns exemplos do que já hoje existe no universo IoT. O objetivo de todos estes dispositivos e da recolha de dados resultantes da sua interação através da Internet é o seu processamento para, por exemplo, evitar engarrafamentos de trânsito, antecipar, a tempo, a ocorrência de uma doença fatal num doente ou um incidente num edifício e utilizar a energia de forma mais eficiente.

No futuro, todos os negócios serão seguramente diferentes. A IoT está a ser combinada com múltiplas tecnologias para transformar dados em conhecimento. As empresas usam-na para mudar estratégias e modelos de negócio e criar novas ofertas para o cliente. É um processo evolutivo onde a experimentação é uma constante e os desafios e as incógnitas são imensos.

A recolha e a disponibilidade deste grande volume de dados permitiram, por exemplo, a emergência de novas empresas de matriz estritamente tecnológico no setor da energia. Segundo Carlos Costa Pina, administrador da Galp, que participou num debate que reuniu players das áreas da saúde, banca e seguros e energia, moderado por Rogério Carapuça, presidente da APDC, “o principal desafio da Galp é não se deixar ultrapassar pelas transformações que estão a ocorrer e manter a sua base de clientes”.

A EXPERIMENTAÇÃO É ESSENCIAL

O orador principal da conferência, Miguel Lopes, da OutSystems, afirmou que não há limites para a imaginação em relação ao que se pode fazer com a IoT. “À volta de um simples dispositivo de um automóvel pode ser criado um novo negócio para a indústria ou setor segurador”, referiu como exemplo.

Mas para que isso aconteça é fundamental recolher os dados, interpretá-los e construir o projeto com base nessas informações. “Não é algo que se consiga de imediato”, alertou o especialista, acrescentando que é necessário criá-lo de forma orquestrada, por fases. “Temos de pensá-lo e viver num modo de experimentação contínua, atitude fundamental para a evolução positiva de qualquer modelo de negócio”, disse Miguel Lopes. Mas não só, porque também é necessária a colaboração de todos os players para o concretizar, defendeu, por seu turno, Francisco Barbeira, administrador executivo do BPI. Afinal, e como refere Rogério Carapuça, “existem, hoje, mais ligações à Internet do que pessoas à superfície da Terra”. Ou seja, há um número infinito de dados a ser produzidos de forma constante, que poderão ser melhor utilizados com a colaboração de todos os envolvidos.

Segundo Francisco Barbeira, os bancos estão satisfeitos em relação ao volume e qualidade dos dados que recolhem dos seus clientes quando levantam dinheiro nas ATM, pagam com cartão, telefonam ou vão a um balcão. Mas “ainda há espaço para melhorar esta relação”. No futuro, a confirmação das identidades poderá ser feita por voz, o aconselhamento financeiro, agora restrito a determinados clientes, poderá ser alargado e a experiência de acesso ao crédito terá menos exposição pessoal do que acontece hoje. Mas a IoT tem âmbito muito mais alargado do que os exemplos que já foram citados.

PREVENIR EM VEZ DE CURAR

Rui Raposo, administrador da José de Mello Saúde, mostrou que a simples lavagem matinal de dentes poderá contribuir, se a escova tiver um sensor adequado, para ajudar a avaliar diariamente a saúde das pessoas. Também citou o exemplo do Hospital de Logroño, em Espanha, que tem 70 doentes monitorizados em casa, ligados a um contact center. “Isso permite avaliar, em tempo real, a temperatura, o peso, a tensão arterial, e recolher outras informações”, explanou Rui Raposo. Para este responsável, a IoT será essencial, no futuro, para manter mais pessoas fora do hospital, passando do paradigma atual de tratamento de doenças para o da sua prevenção.

As tecnologias aplicadas aos automóveis também servem para prevenir acidentes e a sua gravidade. Eduardo Romano, Chief Information Officer (CIO) da Liberty Seguros, disse que são avanços como este que fazem com que as seguradoras tenham os dias contados. Com um conhecimento dos clientes e dos riscos cada vez mais apurado, o setor irá defrontar-se com a extinção de alguns seguros não obrigatórios, substituídos por soluções tecnológicas eficientes. Ficarão os seguros obrigatórios e os eventos da Natureza.


P&R

Rogério Carapuça, presidente da APDC

Quais as vantagens da integração que traz a Internet das coisas?
"Hoje já existem mais ligações à Internet do que pessoas à superfície da Terra. Por isso é possível ter sensores e outros dispositivos de vários tipos colocados nas mais diversas situações, que nos vão dando informações, em tempo real, sobre o que está a acontecer, com muitas grandezas físicas de coisas que podem ser relevantes para negócios.
Existem, por exemplo, sapatos com sensores, para se saber a velocidade a que as pessoas correm e os caminhos que percorrem na cidade. E sensores em motores de avião, locomotivas, automóveis e iPhones, para se perceber qual o seu desempenho."

Há riscos no seu uso?
"É evidente que tudo o que fazemos vai sendo cada vez mais monitorizado pelos dispositivos. Isso significa que as pessoas têm de ter cada vez mais cuidado com a sua privacidade, a forma como a sua pegada digital se vai aprofundando em todas as coisas que fazem."

Carlos Costa Pina, administrador da Galp

De que forma é que a Internet das coisas está a mudar a Galp?
"Os principais desafios da indústria de petróleo e gás são a descarbonização, a geração distribuída e a digitalização. Quando falamos da Internet das coisas, estamos a falar do terceiro.
Nós ou vencemos este desafio ou somos derrotados. E o que estamos a fazer na Galp é trabalhar para triunfarmos. No que respeita à refinação, com a utilização de sensores para manutenção preditiva. Ao nível dos negócios business to business (b2b) e business to consumer (b2c), decidimos adquirir, em Espanha, a Podo, empresa 100% tecnológica para comercialização de eletricidade no negócio b2c. O negócio está a evoluir positivamente e poderá ser escalável também ao b2b, ao gás e até a uma plataforma ibérica."

Quais as principais vantagens para o negócio?
"A principal é ter capacidade para continuar no negócio. A antevisão que temos da forma como será o mundo da energia e da economia daqui a 10 anos prevê uma relação desmaterializada com o cliente, essencialmente eletrónica e digital.
Então, empresas como a Galp só poderão estar nesse negócio servindo o cliente com a sua marca, mantendo uma relação direta e preservando a sua imagem, forma de atuação, credibilidade e lealdade do cliente. De outra forma alguém irá fazer isso e a Galp terá de oferecer um produto de energia de marca branca.
Não é isso que queremos, mas sim continuar a servir os clientes preservando uma relação direta e sustentável com eles. Por isso a opção pela digitalização, tirando partido das oportunidades, é uma prioridade estratégica da Galp."